Este espaço é destinado às construções em Biologia e Educação dos estudantes de Ciências Biológicas da UFSC

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Qual a utilidade em TER algo que não se pode SER?

Em muitas cosmovisões indígenas, a vida é vista como uma dança cósmica que flutua sobre o sopro divino da nossa Mãe, e que está em harmonia com o ar, o rio, as plantas, as bactérias, com os animais, todos os seres vivos naturais e sobrenaturais estão dançando essa sublime coreografia em harmonia e cooperação. Como pode algo tão lindo e significativo ser reduzido a uma vida de preparação para o mundo do trabalho e acumulação de pedaços de papeis coloridos? Essa visão reducionista ocidental, que busca dar uma utilidade para nossa existência, vem sendo imposta a muitas outras culturas desde séculos atrás no Brasil, de forma que fica difícil nos percebermos inseridos nesse contexto que se nutriu historicamente pela escravidão e genocídio de pessoas africanas e indígenas. 

Vários dos trabalhos finais de estudantes de Tópicos em Biologia e Educação, durante o semestre de 2020/2, buscaram descolonizar essa visão presente na nossa política, economia, biologia, enfim, nas formas como nos relacionamos com a vida na Terra.


Desde a época do início da colonização, a escravidão gerava (gera) enormes fortunas que solidificaram as bases do capitalismo. Para atender a esses interesses econômicos, foi necessário criar "racionalizações" como desculpa para a diáspora africana e os genocídios africano e indígena: a ciência construiu movimentos como a eugenia e o darwinismo social, fornecendo subsídios para hierarquização e destruição de pessoas e de seus conhecimentos. As influências dessas "racionalizações" permanecem até hoje e são problematizadas pelo trabalho "O conhecimento indígena também é científico" das alunas Maria Eduarda e Maria Luiza e dos alunos Édivin João e Julio Ernesto, que busca explorar e valorizar o conhecimento indígena, com uma série de colagens e pensamentos dos/as autores/as:



No trabalho elaborado por Luiza Braulina Conceição, Lenita Cabral dos Anjos e João Rafael Zapelini Guião Coelho podemos observar como temos essa tendência em classificar tudo que se considerou ser "descoberto" e pode ter alguma utilidade, principalmente econômica, que nos remete também à rede de pesca utilizada na imagem capturando a biodiversidade.


Já as alunas Lauren Bonfanti Fontoura,  Ana Júlia dos Santos e Robert Lauro Nunes Kroon criaram uma capa de CD cujo álbum seria "Antropocentrismo Enraizado". Acho que todo mundo gostaria de ouvir esse CD né? Mas a gente pode ter um pedacinho dele, já que a Lauren, a Julia e o Robert prepararam um vídeo de introdução ao CD, uma mensagem ao futuro, a partir de um presente pandêmico... ele está logo abaixo:




Seguindo nessa mesma linha, os/as alunos/as Débora Malu Marquato, Henrique Webber Andriolo e Okesanna Eduarda Puhale elaboraram uma colagem que nos traz a reflexão sobre a relação entre algumas doenças e como elas se dão pelo contato e relação que se tem com a natureza, como a covid19.


A aluna Rafaela Marcondes aborda também essa nossa relação com a natureza ao questionar alguns teste científicos como de alergenicidade, citotoxidade, fototoxidade e mutagenecidade que, apesar de serem cruelmente realizados em animais vivos (não-humanos), já estão dessensibilizados pelas pessoas que se utilizam de tais produtos no cotidiano. 



Os/as alunos/as aluna Júlia Montegutti, Altamir Rubio Junior, Guilherme Khoury e Bruna Alexandre convidam nossa consciência para o show de horrores que temos vivido, imersos no e pelo egoísmo humano. O evento, denominado “Em busca do fim do mundo”, busca satirizar a situação político-administrativa do nosso país, principalmente em relação à liberação de agrotóxicos (em 2 anos de mandato, a atual gestão presidencial já liberou 967 agrotóxicos) e desmatamento das matas nativas. Acho que vamos precisar de estômago para esse espetáculo, bora?



Um grande problema relacionado ao uso desses agrotóxicos é a contaminação de bacias aquíferas, rios, lagos, e outras variedades de ambientes aquáticos sujeitos à destruição capitalista. Não obstante em nos podar e dar uma utilidade em nossa vida, o capital ainda tira o que há de mais fundamental em nossa constituição material, onde surgiu a vida no planeta e o que ninguém consegue ficar sem, por mais de uma semana: a água. Dessa maneira, as/os alunas/os Giovana Garrido, João Pedro Cechinel, Luisa Peres e Sarah Knoll construíram um podcast chamado "Consegue me ouvir?", no qual temos um relato em primeira pessoa da Água. Se a Água falasse a língua humana, o que ela nos diria? O que ela acha da ciência? Acompanhe o podcast, clicando na imagem abaixo:


Podemos nos questionar sobre como essa degradação ambiental, que se dá muito pelas mãos das grandes indústrias, pecuária e agricultura extensivas de nosso território é colocada nos ombros da população de classe baixa ou média baixa: nas usuais campanhas para não se demorar em banhos, deixar a luz acesa, lavar a calçada, entre outros... o trabalho dos alunos Gustavo Griebner, Henrique Pereira e Otávio Aguiar questiona essa responsabilidade:


É válido e interessante que nós economizemos água, mas mais importante que isso, num país como o nosso (onde 27 milhões vivem abaixo da linha de pobreza e 35 milhões não tem acesso à água potável), é importante ter água chegando na sua casa para poder economizar...

Para encerrar nossas discussões, decidi deixar por último o trabalho da Georgia Silva Gondim, João Pedro Almeida Araújo, Mélani Zmorzynski e Nadine dos Santos Böel, para nos questionarmos: ecologia para quem? O que é nossa casa? Seria esse pequeno quadrado de concreto que vivemos isolados de tudo, inclusive nós mesmo? Se a ciência é tão evoluída e o conhecimento tradicional primitivo e ultrapassado, como pode a ciência causar tanta destruição ao nosso lar, enquanto muitas das populações indígenas são a última fronteira de resistência dos territórios? Veja o vídeo elaborado pelos/as alunos/as abaixo:


Referência base:

MILANEZ, Felipe. Fundamentos de ecologia. Salvador: UFBA, Faculdade de Direito; Superintendência de Educação a Distância, 2020. 64 p. ISBN 9786556310039 (Broch.).


terça-feira, 4 de maio de 2021

Corpo humano é diversidade

 As reflexões das turmas do semestre 2020.1 chegaram também em nossos corpos e atravessaram o ensino. Como aprendemos sobre o corpo humano na escola? E na faculdade? Há muita coisa para mudar e muitas coisas para representar. As percepções do ensino do corpo humano chegaram para todo mundo da mesma forma: um único corpo é representado, um corpo é naturalizado e visto como padrão. Não há diversidade de cores, tamanhos, deficiências.

Os trabalhos das turmas foram pensados na subversão desse padrão. Bruna Bergman Machado e Lucas T. A. Sato nos apresentam essa ilustração cheia de cor e diferenças, com tantos corpos (humanos ou não) sendo representados.


A diversidade no trabalho de Eduardo B. Chagas e Élita T. de A. Weschenfelder não tem um rosto: estão por trás de bandeiras de gênero e sexualidade, para lembrar que só nós mesmos podemos afirmar sobre os nossos corpos e nossos afetos e ninguém mais.


Na proposta de Bruno Losi Menna, é mostrado que a diversidade também estava presente nos ancestrais humanos, trazendo ainda evoluções ficcionais.


Pensando na falta de diversidade de corpos, as alunas Lara Dalkmin Trombe e Maria Eduarda L. Cabral nos trazem essa colagem digital e nos questionam onde está a inclusão. Onde estão as pessoas com seios nas representações didáticas? Onde estão as pessoas negras?

Até mesmo partes de nossos corpos são padronizados. As representações são geralmente as mesmas: brancas e sem pelos. Mas quando olhamos para nós propriamente, não encontramos esse padrão. E é necessário representar. Assim, Ana J. Poletto, Eneli Gomes e Renata Alves nos trazem as ilustrações de vulvas de Hilde Atalanta e com os escritos "essas somos nós". Somos mulheres cis, mulheres trans, homens trans, pessoas com vulva. Somos diversas.







E pensando em pessoas que nascem sem a binariedade de gênero (feminino e masculino) imposta pela sociedade, que é atribuída através das genitálias, Ana Carolini Adriana da Matta e Dayane M. Laurentino nos trazem esse material informativo sobre a interssexualidade

Como seria um livro didático que representasse a diversidade de corpos? O trabalho de Yasmin Cristina da Silva, Marlon Goedert e Lethycia C. da Rosa traz alguns exemplos que poderíamos ver nos livros com essas ilustrações.




E nesse trabalho de Isadora Pineda, os corpos não são apenas corpos: eles possuem nomes e profissões. Podemos nos identificar com eles através dessas ilustrações.

Pensando em aproximar as pessoas ainda mais do ensino do Corpo Humano, Helena Yurevna Caio, Ohanez Mamigonian, Rafael Augusto Camargo e Rafael Krug Giacomini elaboraram um filtro de aplicativo de celular, bem como as imagens dos sistemas do corpo humano que aparecem nele. Para isso, foi feito um vídeo apresentando o filtro: 

O aplicativo é o Snapchat e para acessar os filtros, clique aqui e aqui (ou aponte o celular para os QR codes).

 Por fim, Thiago Fabiano Blanco e Rafael Emmanuel Godoy Martinez nos trazem esse texto que fala que somos muito mais que apenas um corpo, que merecemos e devemos ser respeitadas e para isso, lutaremos. Somos feitas de amor.

Arte de citrinepalace 

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Olhares, contradições e conhecimentos da pandemia

Durante um atípico semestre pandêmico (2020.1 - que ocorreu, efetivamente nos meses de agosto a dezembro de 2020), a Disciplina de Tópicos em Biologia e Educação convidou estudantes do curso de Ciência Biológicas a refletirem sobre como a Biologia, a partir da perspectiva dos Estudos Culturais, pode ser entendida também, como Cultura. Como tal, ela busca explicar o mundo natural, mas não é ele em si, tendo uma história que não é natural (SANTOS, 2000). Nesse sentido, como podemos colocar nossos olhares para identificar contradições, ou mesmo, "desnaturalizar" nossos modos tradicionais de aprender e ensinar Biologia? Assim como sugere Cortella (2013), propusemos pensar a Biologia "para além das nossas retinas fatigadas", subvertendo certas ordens do olhar.



Iniciamos esta proposta com o trabalho desenvolvido por Luan Caetano de Souza, Beatriz Maria Ribeiro e Letícia Martins Souza que nos convidam a pensar em nossos "Olhos (em tempos de pandemia)", através da construção do vídeo-poema acima. 



Considerando-se os acontecimentos que nos instam em outras perspectivas, tantas histórias que acontecem nesse momento em que estamos em casa, mas muitos estão nas ruas, gritando-se as contradições que convivem, sob tantos olhares, como demonstrá-las, em imagens? Imaginá-las? Apresentamos algumas das propostas em "imagen-ação" das reflexões advindas do período.


Importante relembrar sobre as relações entre humanos e vírus que são contadas nessa época: vilões microscópicos que colocam em risco a vida. Mas seriam eles os únicos vilões? Vilões para quem? Estas são as reflexões propostas por João Paulo Ernzen, Henrique Borges da Silva Grisard, Victória Torres Makowiecky e Luiza Schmidt Dagostini na colagem de sua criação.


Passeamos, imageticamente por diversas histórias deste período, marcadas a fogo, do qual só vimos um dia virar noite, pelas janelas das habitações, ou das TVs... esquecemos que o agro só é pop para uma parcela muito pequena da população, como apontam a imagem de Ana Julia Brassolati Salviano, Fernanda Luiza de Oliveira Quevedo dos Santos, Maria Clara Pereira Pereira Carvalho de Souza e Letícia Fortulino Trajano

mas há quem está vendo de perto, suas vidas e conhecimentos serem consumidos pela fogueira, como nos lembram Evelyn Martins Goulart, Gabriel Francisco Salamon e Lucas Saraçol Lopes, em sua produção sobre epistemicídio e resistência.



Nesse semestre, foram muitos processos de compreensão do novo, de experimentar ações e, em especial de (re)construir. Estela Carvalho Schmidt aproveita para contar como foi um desses processos, trazendo não apenas seu produto final, mas demonstrando que, qualquer construção tem história e não é natural.





Referências Citadas:

CORTELLA, Mario Sergio. Não se desespere!: provocações filosóficas. 3a Ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2013.

SANTOS, L. H. dos. A Biologia tem uma história que não é natural. In: COSTA, Marisa Vorraber (Org.) Estudos Culturais em educação: mídia, arquitetura, brinquedo, biologia, literatura, cinema... Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2000.