
A tirinha aborda o uso de drogas por estudantes universitários, apresentando dados de uma suposta pesquisa do IBGE. Mas qual seria o intuito dessa pesquisa? Avaliando apenas as informações da imagem não podemos concluir como foi feita a abordagem desses estudantes, nem ao menos a pergunta feita a eles. Sem as informações corretas fica muito difícil saber se foi questionado apenas o uso de drogas ilícitas ou se abrangia todas elas e até mesmo a frequência do uso (se foi apenas para experimentar ou se é consumida no dia-a-dia) pode ter ficado de fora, o que restringe o foco de quem lê a tira.
Fica evidente, através do humor da mesma, a ideia ainda sustentada pela sociedade de que adolescentes e universitários são, por natureza e por culpa dos hormônios, mais susceptíveis às drogas, às “badernas” e “arruaças”. Banalizar o estudante, tratá-lo como um “maconheiro qualquer” é também uma forma de enfraquecer sua representação, o discurso universitário, as práticas políticas estudantis.
Esses alunos abandonariam as drogas depois de formados? De "amadurecerem", ou isso significa que em poucos anos quase 70% da nossa sociedade será formada por consumidores de drogas?
Pelo que dá a entender nos quadrinhos, o consumo de drogas seria um “pré-requisito” ou um “aquecimento” no ingresso às instituições de ensino superior, já que o garoto afirma fumar maconha pra cursar medicina, curso que também não foi escolhido aleatoriamente, tendo em vista a dificuldade e concorrência na área, por isso o preparo com antecedência, a fim de sair à frente de outros candidatos.
A figura do estudante da tira parece tendenciosa, pois ele é negro, usa dreads e suas roupas têm as cores da bandeira Rastafári, imagem pré-concebida de usuários de maconha, o que é por si só preconceituoso, tendo em vista que não existe um perfil exato de consumidores, nem na questão de gênero, ou sua etnia, estilo, religião, etc. O personagem retratado dessa maneira deixa margem para alimentar a discriminação já existente em nosso país. E a garota da tira? E se fosse ela a usuária e o rapaz ficasse em choque? Será que isso alteraria o conteúdo humorístico? Tendo em vista que ela aparece em trajes ‘conservadores’ (não dá para ter certeza se a personagem é uma professora, nerd, mãe...), ou talvez por ser mulher, ela não poderia ser retratada como consumidora por ser ‘politicamente incorreto’?
Claro que se trata de uma tirinha de humor, mas que pode alimentar ainda mais preconceito se não forem retratados todos os lados que a questão aborda, tanto quando falamos do consumo, do perfil do usuário, ou até mesmo dos questionamentos da pesquisa.
Anna Luiza Remor, Karine Benitez, Felipe Barbosa